A produção cultural percorre diversos caminhos até chegar ao público, e por vezes, nem alcança quem mais a procura. Um trajeto perpassado de problemáticas estruturais em seu fomento, manutenção e distribuição do resultado final. Em meio a esse processo está a figura do ativista cultural, que busca de diferentes formas contribuir para a democratização e viabilização dos meios necessários ao fazer artístico e cultural.
Erivelton da Cunha é um desses atores sociais. Ativista cultural e produtor, identifica de modo pontual muitos dos impasses no setor cultural da arte popular e folclórica. Licenciado em Música pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), o morador da cidade de Pocinhos, no interior da Paraíba, relata suas vivências em entrevista concedida à equipe do Campina Cultural.
Vevel de Pocinhos, como é popularmente conhecido, iniciou sua carreira no ano de 2004 na construção do espetáculo “Paixão de Cristo”. Atualmente está como Diretor do Grupo de Danças Folclóricas Sisais, onde percebe o poder transformador do acesso à arte. O grupo teve a oportunidade de participar, em 2017, do Festival de Folclore de Olímpia (SP), um dos maiores festivais do pais. Além da realização de viagens fora do Brasil, representando internacionalmente a cultura da cidade de Pocinhos.
Veja os principais pontos da entrevista.
Como é coordenar e gerenciar pessoas de diferentes linguagens artísticas?
Cada cabeça é um mundo, o jovem é muito ativo, muito fervoroso. No que se refere ao teatro, às vezes a gente tem que chamar atenção para a questão dos ensaios, para se concentrar na cena, parar as brincadeiras. Cada cabeça é muito diferente, mas eu tento equilibrar para que a gente fique ali no foco da arte, mostrar pra eles a importância da arte. Quanto ao outro trabalho, o Balé de Sisais, é um desafio para correr atrás das coisas, de patrocínio, de preparar documentação de todo mundo. E é claro que requer atenção a parte musical, né? Eu auxilio nos repertórios, arranjo, em alguma dificuldade de algum instrumento para alinhar as coisas. E isso é um desafio que pelo amor, pela paixão, pela arte, a gente vai vencendo.
Qual a sua participação na Organização Internacional de Folclore e Artes Populares, da UNESCO?
Hoje existem várias organizações internacionais de folclore que organizam festivais pelo mundo inteiro e a IOV é uma delas uma grande organização que a cada ano vai crescendo. Eu me filiei em 2019 e tenho muito orgulho de participar, porque trabalha com folclore, arte popular, artesanato, música, dança, cordel. A IOV tem uma gama de ações para abraçar a cultura popular, o folclore, não fica limitada só ao festival de dança folclórico.
De qual forma o poder público fortalece ou poderia auxiliar esses artistas independentes?
É muito difícil o artista sobreviver diante do descaso do poder público, porque sempre são as migalhas que sobram pra cultura. Uma desvalorização que não é só local, é a nível nacional. Quando a gente vai participar de um festival, representar a cidade, recebe várias portas fechadas na cara. Mas a gente não desiste, a gente insiste até conseguir alguma coisa. É uma luta constante em todos os lugares. O poder público ainda tem um olhar muito distante para a cultura, mas o segredo é não desanimar, mesmo tendo todo motivo pra desistir, o segredo é lutar sempre.
De qual forma locais periféricos e marginalizados são distanciados da cultura e dos processos criativos?
As periferias são carentes não só de recursos financeiros, mas de cultura também e o que a gente pode fazer é dar o pouco que a gente sabe. Percebemos que a vontade das crianças e dos adolescentes de aprender é maior, a fome por aprender é visível. Eles são interessados em trabalhar com o que for: música, teatro, dança. Estão carentes e eu acho que nosso papel como ativista cultural é contribuir com o pouco que a gente sabe, porque é muito prazeroso. A gente tem o dever, assim como tem a gestão do poder público - que nem sempre cumpre com a sua parte -, mas a parte que nos cabe como ativista cultural é matar essa fome que existe na região dos periféricos.
De qual maneira as escolas poderiam fomentar uma leitura mais crítica do processo e do consumo da arte?
Das várias frases que Ariano Suassuna falava, sempre lembro de uma. Ele dizia que a universidade dá aula de costas para a cultura popular. Ainda existe um ensino sistemático na universidade, quando você procura alguma coisa em relação a cultura popular, dificilmente vai encontrar, ainda há uma cultura muito elitizada. E com relação à escola, é ainda mais difícil. Tem um professor de artes para as coisinhas básicas: como é que pinta, como é que mistura o amarelo com azul, mas a gente não tem uma forma de ensino da cultura popular. A escola tem um papel importantíssimo na formação do ser humano, mas falta um olhar especial para a arte, falta inserir mestres da cultura local popular que é tão importante.
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Texto: Emanuelly Lucena e Felipe Bezerra
Entrevista: Wanderson Gomes
Produção: Ana Luísa Rocha
Supervisão Editorial: Ada Guedes
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